Por Leandro Fortes
Entre todas as bizarrices expostas
pelo WikiLeaks, a mais interessante é a revelação, sem cerimônias, de
que a Embaixada dos Estados Unidos mantinha (mantém?) uma verdadeira
sucursal informal no Brasil, na qual se revezavam jornalistas (de uma só
tendência, é verdade), a elaborar análises políticas – todas furadas,
diga-se de passagem.
Na redação da embaixada brilharam,
primeiro, os colunistas Diogo Mainardi, da Veja, e Merval Pereira, de O
Globo. Segundo despacho de Arturo Valenzuela, secretário adjunto de
Estado para Assuntos do Hemisfério Ocidental, em 2009, o “renomado
colunista político” Mainardi, em almoço privado (?), disse que uma
coluna propondo que a ex-candidata presidencial do Partido Verde (PV) e
ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva se tornasse candidata a vice
do tucano José Serra havia nascido “de uma longa conversa” entre os
dois, Serra e Mainardi, na qual o ex-governador de São Paulo afirmara
que Marina seria sua “companheira de chapa dos sonhos”. De acordo com
Valenzuela, Serra alinhou naquela conversa com Mainardi as mesmas
vantagens que o colunista, mais tarde, iria listar em sua coluna: a
história de vida e as “credenciais esquerdistas impecáveisï �½ �� de
Marina poderiam bater o apelo pessoal de Lula aos brasileiros pobres e
colocar Dilma Rousseff em desvantagem com a esquerda. Ao mesmo tempo, a
vice verde ajudaria Serra a “mitigar” sua associação com o governo de
Fernando Henrique Cardoso. Mainardi ainda preconizou que, mesmo sem sair
como vice, Marina poderia apoiar Serra num segundo turno contra Dilma.
Também apostou que Aécio Neves iria se juntar à chapa de Serra. Um
profeta, como se vê.
A mesma lengalenga Arturo
Valenzuela ouviu do colunista Merval Pereira, que rememorou uma conversa
tida entre ele, Merval, e Aécio Neves, um dia antes do jornalista se
reportar à Embaixada dos EUA, em 21 de janeiro de 2010. Ou seja,
informação quentíssima! A Merval, informou Valenzuela à Casa Branca,
Aécio Neves teria dito estar “firmemente compromissado” em ajudar Serra
de qualquer maneira, inclusive se juntando à chapa. Uma chapa
Serra-Neves, opinou Merval Pereira ao interlocutor americano, venceria
fácil. “(Merval) Pereira pessoalmente acredita que não só Neves
concorreria com Serra, mas que Marina também apoiaria Serra em um
segundo turno”. Outro profeta.
Agora, sabemos pelo WikiLeaks que
Humberto Saccomandi, editor de notícias internacionais do jornal Valor
Econômico, acompanhado do analista político Rafael Cortez, da Tendências
Consultoria, também foram convocados pela sucursal da Embaixada a
analisar a candidatura de Dilma, mas estes acertaram: a subida de Dilma
Rousseff nas pesquisas iria favorecê-la no congresso nacional do PT, no
fim de fevereiro de 2010, onde se esperava que ela anunciasse sua
candidatura oficialmente.
Classificados de “críticos mais
duros de Rousseff”, os jornalistas William Waack, da TV Globo, e Hélio
Gurovitz, da revista Época, também foram à Embaixada dos Estados Unidos
dar pitaco, mas em clima de torcida organizada pró-Serra. Waack
descreveu para o Consulado Geral, em São Paulo, sua ida a um fórum de
negócios do qual José Serra, Dilma Rousseff, Aécio Neves e Ciro Gomes
tinham participado. A análise, não fosse surreal, é pouco mais do que
rasa. “De acordo com Waack, Gomes foi o mais forte no geral, Neves o
mais carismático, Serra desligado, mas claramente competente (grifo
meu), e Rousseff, a menos coerente”, escreveu, à Casa Branca, o
embaixador Thomas Shannon, editor-chefe da sucursal. Crítica duríssima,
essa de Waack.
Helio Gurovitz, diretor da Época,
foi mais adiante ao se reportar à Embaixada do EUA. Descreveu o Brasil
como similar ao Chile (onde a esquerdista Michelle Bachelet perdeu a
eleição para o direitista Sebastián Piñera). Argumentou que a “base
social do país” se desenvolveu de maneira que esta “base” – seja lá o
que for isso, o povo é que não era – preferiria alternar partidos no
poder para manter continuidade (sic), em vez de manter um partido no
poder no longo prazo, “com isso provocando uma guinada na direção
daquele partido no espectro político”. O embaixador, creio, não entendeu
nada. Mas registrou, por via das dúvidas.
Com analistas assim, não é à toa que o governo Obama se encontra na situação que está.
FONTE
http://www.conversaafiada.com.br/pig/2011/03/15/leandro-como-jornalistas-brasileiros-servem-a-casa-branca/
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