Um império contra um operário
A mídia, Globo na frente, não dá trégua ao ex-presidente. Por Mauricio Dias
Nunca foram boas as relações
entre a mídia brasileira e o torneiro mecânico Lula, desde que, nos anos
1970, ele emergiu no comando das jornadas sindicais no ABC paulista,
onde estão algumas das empresas do moderno, mas ainda incipiente
capitalismo brasileiro. Em consequência, quase natural, o operário não
foi recebido com entusiasmo quando, após três fracassos, venceu a
disputa para a Presidência da República, em 2002.
Os desentendimentos se sucederam
entre o novo governo e o chamado “quarto poder” e culminaram com a crise
de 2005 quando televisões, jornais, rádios e revistas viraram
porta-vozes da oposição que se esforçava para apear Lula do poder.
Inicialmente, com a tentativa de impeachment. Posteriormente, após esse
processo que não chegou a se consumar, armou-se um “golpe branco” em
forma de pressão para o presidente desistir da reeleição, em 2006.
Lula ganhou e, em 2010, fez o
sucessor. No caso, sucessora. Dilma Rousseff sofreu quase todos os tipos
de constrangimentos políticos. Ela tomou posse e, no dia seguinte, foi
saudada por deselegante manchete do jornal O Globo, do Rio de Janeiro:
“Lula elege Dilma e aliados preparam sua volta em 2014”.
A reportagem era um blefe
político. Uma “cascata” no jargão jornalístico. O jornal O Globo, núcleo
do império da família Marinho, tornou-se a ponta de lança da reação
conservadora da mídia e adotou, desde a posse de Lula, um jornalismo de
combate onde a maior vítima, como sempre ocorre nesses casos, é o fato.
Sem o fato abre-se uma avenida para suspeitas versões.
O comportamento inicial da
presidenta, marcado por discrição e austeridade, foi uma surpresa para
todos. O Globo inclusive. Não há sinais de que seja uma capitulação ao
poder dos donos da mídia com os quais Dilma tem travado discretos
diálogos. Armou-se circunstancialmente um clima de armistício. Na
prática, significou um fogo mais brando, a provocar um visível recuo de
comentaristas que eram mais agressivos com Lula. Soltam, porém, elogios
hesitantes por não saberem até onde poderão seguir.
Esse armistício se sustenta
numa visão de que as situações não são iguais. Dilma não é Lula. É claro
que há diferenças entre o governo de ontem e o de hoje. No entanto, o
carimbo pessoal da presidenta na administração do País faz a imprensa
engolir a propaganda de que ela era um “poste”. Essa contradição se
aguça na sequência dessa história. Dilma passou a ser elogiada e Lula
criticado.
Alguns casos, colhidos da primeira página de O Globo ao longo de uma semana, expressam o que ocorre, em geral, em toda a mídia:
Atos de Dilma afastam governo do estilo Lula (6/2) – críticas ao ex no elogio ao governo Dilma.
Por qué no te callas? (8/2) –
crítica atribuída a um sindicalista, mantido no anonimato, sobre apoio
de Lula ao salário mínimo proposto por Dilma.
A fatura da gastança eleitoral (10/2) – a respeito de despesas do governo Lula com suposta intenção eleitoral.
Dilma aposenta slogan de Lula (11/2) – sobre a frase “Brasil, um país de todos”.
Herança fiscal de Lula limita o começo do governo Dilma – (13/2) – crítica a Lula ao corte no Orçamento proposto por Dilma.
Ela recebe afagos e ele,
pedradas. Procura-se, sem muito disfarce, cavar um fosso entre o ex e a
presidenta. Situação que levou Lula, na festa de aniversário do PT, a
reagir: “Minha relação com Dilma é indissociável”.
FONTE
http://www.conversaafiada.com.br/pig/2011/02/18/dias-na-carta-pig-principalmente-a-globo-nao-da-tregua-ao-nunca-dantes/
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